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Consciência Negra: identidade e contribuição cultural

“Sou negro/a, atabaque corre em minhas veias, a minha cor. É a força do Axé e do Candomblé. A minha vida, foi sempre lutar pela liberdade, Sonhada pelos meus ancestrais, que vieram da Mãe preta África. Lutaram junto com o valente Zumbi, foi ele quem nos libertou…” Afoxé Alafim Oió

 

A data de 20 de novembro relembra o legado de Zumbi, líder do quilombo dos Palmares assassinado nesta mesma data no ano de 1695. O quilombo dos Palmares, o maior do seu porte, foi localizado entre os estados de Pernambuco e Alagoas. Contava com o centro administrativo Macaco e diversas outras cidades menores ao redor.

 

História é memória 

 

O processo de colonização das terras que hoje chamamos de Brasil segue acontecendo a partir da busca de controle dos povos oprimidos, distorcendo sua compreensão mental e suas relações com o passado. É importante lembrar que a formação sociocultural brasileira vem a partir da colonização exploratória, genocídio indígena, miscigenação forçada e escravismo de povos africanos, e que a abolição acontecida por aqui em 13 de maio de 1888 deu fim ao último regime escravocata do mundo. 

 

Sim, fomos o último país a abolir a escravidão!

 

A partir desse processo histórico, a cultura negra foi essencial para a formação da identidade brasileira. Mas somente a partir do século XX que as manifestações, rituais e costumes de origens africanas começaram a ser aceitas como expressões nacionais. Vários aspectos das culturas africanas permanecem vivas nas artes, na língua e nas religiões brasileiras.

 

Os africanos trazidos à força ao Brasil não abandonaram seus costumes, tendo uma  grande influência na fé brasileira. Em suas crenças, a música e a dança tinham forte ligação com o mundo espiritual e com o poder de comunicação. Daí provém o samba, o batuque, o jongo, o lundu e a capoeira. Esta última, como uma junção entre dança, luta, cultura popular e música.

 

Nestas terras de Pindorama os negros escravizados precisaram reinventar sua culinária a partir dos ingredientes que encontravam por aqui, deixando uma vasta herança culinária para o Brasil. Responsáveis pela alimentação dos “senhores” brancos e com a necessidade de suprir sua própria demanda, foram criando alternativas para seus temperos e processos conhecidos. Dando origem a pratos como o vatapá, acarajé, caruru, mungunzá, sarapatel, baba de moça, cocada, bala de coco, dentre outros. Entre suas influências culinárias, a mais popular é a feijoada, originada nas senzalas a partir do cozimento das sobras de carne dos senhores de engenho, junto ao feijão preto.

 

Outra forte influência africana é na religiosidade. Quando chegados ao Brasil, os negros escravizados eram batizados e obrigados a seguir o catolicismo, num processo de “colonização religiosa”. Suas crenças foram demonizadas e desqualificadas, impedindo assim a livre expressão do povo negro. Muito do que sabemos sobre estas religiões neste período foi descrito por policiais ou pela Igreja Católica, sendo fontes históricas enviesadas. De toda forma, os elementos das religiões africanas sobreviveram, se ocultando em meio à simbologia cristã, num processo de resistência que conhecemos como Sincretismo Religioso, que unia os arquétipos e a vibração de entidades próximas entre si.

 

Na cosmovisão do povo Iorubá tem-se um aspecto comum a diversas outras crençasUm ser infinito, imutável e eterno, a partir do qual tudo existe; é chamado Olorum, Olodumaré, Obatalá, Zambi ou Mawu, por diferentes povos africanos. Este ser é o início e fim de todas as coisas (“Eu sou Aquele que É”) e deu origem ao Orun (o mundo espiritual, onde residem os orixás e as divindades) e ao Aiyé (o mundo físico, onde residem a mulher e o homem). Tanto os orixás, que representam as diferentes forças da natureza, quanto os seres humanos são responsáveis por zelar pela Harmonia Universal, o equilíbrio. O equilíbrio entre Orun e Aiye é chamado de Axé e pode ser entendida como “a energia que tudo transpassa”.

 

A arte e as influências dos negros africanos constituíram alicerces para a nação brasileira que conhecemos hoje. “Desafricanizado pela escravidão, não sendo nativo(…), nem branco colonizador, só restou-lhe [ao negro africano] encontrar sua identidade como brasileiro, tendo papel decisivo na formação sócio-econômica e cultural deste país em todos os seus aspectos.” (SANTOS, 2016) – Maria Arlete Santos. De acordo com Abdias do Nascimento, “a sociedade brasileira nasceu sob o signo do racismo e continua racista até agora” e por isso, vale lembrar também as palavras de Angela Davis: “Numa sociedade racista, não basta não ser racista. É necessário ser antirracista”.

 

Que possamos todos fazer parte desta luta.

 

 

| por Júnior Archanjo

Junior Archanjo é natural de Três Pontas, uma cidade no interior de Minas Gerais com forte caráter agricultor e com histórias “deixadas para trás” em suas fazendas e quilombos. Teve acesso ao Ensino Superior graças a política de cotas e se graduou no curso de Licenciatura em Química pela Universidade Federal de Itajubá. Nesse percurso, encontrou na Educação uma forma de incentivar a mudança na realidade social de pessoas que também tem suas possibilidades demarcadas pela cor da sua pele ou pelo desconhecimento de suas raízes. Fruto da miscigenação, com sua pele parda, demorou até a idade adulta para se entender como pertencente à comunidade Negra e encontrar na Umbanda uma forma de entender e cultuar a sua Ancestralidade.

 

Referências:

Marques, R. CONSCIÊNCIA NEGRA: UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE. Disponível em: https://fbes.org.br/wp-content/uploads/Acervo/Publica%C3%A7%C3%B5es/20_de_novembro_rosa_marques.pdf

Benedito, S. R. O fantasma da “raça” ausente: notas pela racialização do debate sobre a reforma sanitária brasileira. Disponível em: https://proceedings.science/abrascao-2022/trabalhos/o-fantasma-da-raca-ausente-notas-pela-racializacao-do-debate-sobre-a-reforma-san?lang=pt-br

Lopes, J. S. C. “NEO ZUMBILISMO É AGORA”: 20 DE NOVEMBRO E CONSCIÊNCIA NEGRA NO BRASIL. Sankofa. Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana, Ano XV, NºXXVI, Janeiro/2022.

Santos, M. A. Contribuição do negro para a cultura brasileira. Temas em Educação e Saúde, v. 12, n. 2, p. 217-229, 2016.