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Muito além do muro: o lugar de Paulo Freire na UNIFEI

Era uma vez uma Escola de Engenharia, formando de maneira brilhante, engenheiros para todo o país. Devagar, o sonho de ampliar o espaço, multiplicar os cursos e diversificar os percursos formativos, coloriu o seu muro, tornando-o acessível e próprio à apreciação, ao encantamento, ao registro da História. Então, primeiro, a escola se transformou em Universidade e depois, compôs o seu muro, não como parede que isola, mas como espaço que agrega, que atrai, que prolonga o encontro cidade e campus, permitindo marcas de pessoas que iluminaram a Ciência. E ali teve espaço para todos e todas, de áreas científicas diversas, como representantes do sentido mesmo da universidade. Paulo Freire está cravado, coloridamente forte, marcando a formação docente, como teórico da Educação. A pergunta que se faz é: Como cabe Paulo Freire numa Universidade construída/enraizada pelos cursos de Engenharia? Qual o lugar de Paulo Freire neste traçado da universidade?

Foi pelo diálogo, pela possibilidade criada de sonhar coletivamente, que a UNIFEI foi deixando de ser EFEI e foi se concebendo como espaço de formação em outras engenharias e em cursos correlatos. Diálogos que fervilhavam pelos corredores, vozes que se fizeram ouvir ampliavam a vontade de fazer daquela escola de formação de engenheiros, também formação de docentes, de administradores, de robótica. Freireanamente, sem terem a noção disto, foi-se redesenhando a Escola para fazê-la mais plural, mais diversa, mais ampla em seus currículos, em seus espaços físicos e epistemológicos. 

Quando, pois, ocorre a transformação da escola em universidade, como processo democrático de disputa e de diálogo, havia, nos intercursos burocráticos e pedagógicos, logísticos e legais, um espaço de reorganização dos saberes constituídos, necessários à institucionalização educativa para além de documentos e ementas curriculares. Paulatinamente, professores-engenheiros, físicos, químicos, matemáticos foram aprendendo a dialogar com outras áreas do conhecimento que não apenas as áreas das exatas. E é neste movimento de repaginação da forma e do conteúdo da então universidade, que se percebe o lugar freireano de pensar e de agir na e para a educação. Um lugar em que a Pedagogia, como ciência da educação, começa a se viabilizar por meio de reflexões de temáticas antes não relevantes para o corpo docente. Questões pedagógicas presentes, agora, no diálogo entre epistemologias outras em projetos de cursos sendo criados, em pesquisas diferentes sendo divulgadas, outras lógicas foram sendo anunciadas. Pluralidade docente exigindo outras aprendizagens, alunos/as diversos compondo as salas de aula e exigindo diferentes abordagens didático-metodológicas.

A presença de categorias freireanas demarca as mudanças, provoca perplexidades, sementeia maneiras outras de ser professor/a. Uma universidade sendo construída por esta diversidade traz, em seu bojo, a necessidade de se refletir e de aprofundar acerca do processo educativo, dos elementos pedagógicos antes, negados, como relação professor-aluno, modos de ensinar, maneiras de aprender, a avaliação como processo e tantos outros temas. Não se trata de aplicar Paulo Freire, mas de utilizar seus conceitos, direta ou indiretamente, no cotidiano do trabalho pedagógico, na postura investida de docência. Porque o legado de Paulo Freire, mais que método, é postura, é princípio, é um conjunto de valores que define uma determinada maneira de ser professor/a, de pensar a educação, de analisar a prática de ensino.

E, sem perceber, a UNIFEI foi subversiva aos moldes freireanos, porque ousou sonhar e mudar uma realidade de uma escola de engenharia, para uma universidade que tem seu muro ampliado, seu espaço habitado por diferentes pessoas, múltiplos olhares. Isto foi, para a História da EFEI refazer costuras, mudar o corte teórico, experimentar o questionamento, reconhecer ideologias, aprender de novo um outro modo de formar profissionais. 

Há, pois nesta transformação da EFEI para UNIFEI um movimento freireano que silenciosamente vai se constituindo fundamentalmente por premissas que estão na obra de Paulo Freire e que nem sempre seus sujeitos têm conhecimento. Se aliada a estas ações, ocorresse a leitura de alguns de seus livros, o processo de transformação pudesse ter sido melhor aprofundado e exemplarmente significado para a comunidade universitária. Porém, a ausência de reflexão direta acerca das categorias freireanas vivenciadas nestes anos históricos da Instituição, não invalida o lugar de Freire. Pelo contrário, confirma sua importância para a Educação. 

À medida que a universidade se consolida como espaço formativo não apenas de profissionais, mas de seres humanos críticos, comprometidos com o contexto social, desenvolvendo projetos que vão além das disciplinas oferecidas, aí estará o forro teórico-prático advindo das ideias freireanas. Mais que pintado em grafite num muro, Paulo Freire tem seu lugar em cada sala de aula, em todo encontro de diferentes saberes, em momentos de cuidado com o outro, em se colocar aprendiz para ser professor/a. Onde há docência e discência, onde há saberes a serem construídos, aí estará Paulo Freire. Por isto, ele vive!

 

Sobre a autora:

|A Dr. Rita Stano é Pesquisadora na área de Currículo, professora por gosto, aposentada pela UNIFEI e freireanamente pensante.