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Maternidade no meio acadêmico

Em 2013 eu era uma pesquisadora que dava absoluta prioridade às minhas obrigações acadêmicas como pós-doutoranda. Foi nesse ano que ingressei em uma universidade pública, e como ocorre com muitas pesquisadoras, a sensação de “estabilidade” deu as mãos para o relógio biológico e eu engravidei. Na verdade foram duas gestações em pouco mais de dois anos, o que representou um período extremamente intenso de cuidado com os bebês e, consequentemente, de queda na produção científica.

Estar ao lado do bebê durante os primeiros meses de vida garante inúmeros benefícios biológicos e sociais, que podem gerar um reflexo positivo na vida da criança (e da sociedade) a curto, médio e longo prazo. Por outro lado, é extremamente difícil para uma cientista estar 100% dedicada ao bebê durante a licença, já que nossas Instituições de ensino e pesquisa não preveem a contratação de substitutos para o trabalho de pesquisa e orientação que é realizado nos laboratórios.

Naturalmente, a tendência é que durante o período de licença, a cientista tenha que lidar com algumas questões inadiáveis da vida acadêmica. Mesmo assim, a produtividade das cientistas tende a cair por pelo menos três anos após o nascimento dos filhos. Essa é a conclusão observada pela iniciativa Parent in Science, da qual faço parte. Nosso grupo é formado por seis cientistas mães e um cientista pai, e foi idealizado pela pesquisadora Fernanda Staniscuaski, mãe de três meninos e que também sentiu na pele os impactos que a maternidade pode trazer à carreira científica: no auge dos cuidados com dois bebês durante a licença-maternidade, ela perdeu o prazo para a solicitação de uma renovação de seu financiamento em pesquisa, e algum tempo depois, saiu do Programa de Pós-Graduação em que participava.

No meu caso, precisei passar uma boa parte do tempo das minhas licenças respondendo e-mails de alunos e colegas, corrigindo trabalhos e conversando com orientados. Mesmo assim, três anos após o nascimento da minha primeira filha, ao oficializar a co-orientação de meu aluno que já estava na metade de seu doutorado, descobri que não estaria apta para o cargo que efetivamente ocupava, pois minha produtividade acadêmica havia caído nos últimos anos. Pode parecer – e realmente é – muito injusto, já que a queda na produtividade deveria ser esperada de um profissional em licença de suas atividades (seja licença-maternidade ou um afastamento por questões de saúde, por exemplo). Porém, essas questões não são levadas em conta em nosso país.

Para discutir situações como essas, vivenciadas por cientistas em todo o Brasil, o Parent in Science promoverá dias 16 e 17 de maio o II Simpósio Brasileiro sobre Maternidade e Ciência. No evento serão divulgados os dados atualizados do Parent in Science, além discutir políticas de apoio à pesquisadoras mães em diferentes países e junto a membros administrativos de agências de fomento e universidades brasileiras. Esperamos que a discussão dessa temática – que diz respeito não somente a mães e pais, mas a toda a sociedade, possa colaborar para a construção de iniciativas que agreguem a manutenção da produtividade acadêmica brasileira com a importância dos cuidados à primeira infância. Mais detalhes sobre o projeto e do Simpósio podem ser obtidos no www.parentinscience.com

Sobre a autora:

| Rossana Soletti

“Doutora em Ciências Morfológicas e professora da UFRGS Litoral. Graduada em Farmácia e Bioquímica, fez mestrado em Neurociências, especialização em Informação científica e tecnológica em saúde e pós-doutorado em Engenharia Biomédica. Atua na pesquisa em câncer e em divulgação científica. Comanda o Maternidade com ciência e é integrante do grupo Parent in Science.”